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O blog atém-se às questões humanas. Dispensa extremismos ou patrulhas. Que brilhe a sua luz. Bem-vindo e bem-vinda!

domingo, 1 de agosto de 2010

Divulgação:
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O texto abaixo saiu publicado nA tribuna Piracicana de hoje, na comemoração de seus 36 anos. É sobre esse personagem emblemático de nossa cidade, que catava pedregulhos, mas nessa crônica ele é procurado por um outro Watson. Faço também alusão ao diretor e escritor teatral Carlos ABC, que está encenando uma peça sobre o Nhô Lica.

Nhô Lica, nossa gente (ficção)

Um estranho homem de terno batia palmas. A mulher espiou, não, não eram os moleques. O que o senhor qué? O senhor olhou para o lugar de onde vinha a voz e tirou o chapéu, contido. Seu terno listrado e um pescoço enfiado dentro de uma educação vitoriana. Fala, hóme! A dona da casa já estava nervosa com o atraso do almoço, o filho que ia para a escola e o tanque cheio de roupas sujas por lavar.
Enfim veio com um lenço na cabeça, tirando a última gota de suor da testa e pendurando o avental num prego providencial na parede. Mais calma atendeu o cavalheiro a lhe parecer ilustre. Vendo-o medroso, deu-lhe uma cadeira no quintal. Sentou-se no assento de palha com o popô de um lorde britânico o senhor Watson. Gesticulava um português ruim e tímido. A mulher achou que era susto e trouxe um copo de água. Parecia gago à mulher, soletrava para dizer os nomes das pessoas. “Você conhecer A...B, C – Carlos?” Mais um vendedor de enciclopédias – pensou a mulher. Naquela rua ela conhecia bem uns cinco Carlos e seu filho também era Carlos. “Carlos nou, Sêr Laica mesmo, nou, dom Lica...como falar eu, Carlos, amigo dele?”
Sem muita comunicação lá ficou Watson em pose olhando sobre os bigodes. As paredes descascadas da casa pobre, um gato que o espiava da porta e alguns pássaros que cantavam da cumeeira. A dona da casa trouxe um papel de pão e um lápis para ele e continuou a rotina doméstica pela casa. De estilo fleumático, ele fez linhas e postava anotações sobre as marcas de migalhas de pão comido. Satisfazia-se. Tirou o relógio do bolso e aferiu o tempo, guardou o dicionário e discreto foi até a cozinha e, sim, queria ver o seu Nhô Lica. Ah, porque não falou antes – lamentou a mulher – tava aqui górica memo. Saiu?! Saíra para o banco. Qual? Se fosse ao da praça era o do lado do próprio. Que lá fosse!
Ufa!... No banco, Nhô Lica depositava as suas pedras “preciosas”, nada mais que vidros garimpados pelo caminho com sua bengala. Desse valor sacava um trocado para o café. Watson o alcançou no bar. Sentou-se ao lado e pediu o seu drink preto para acompanhar, café mesmo. A cidade pacata e de clientes conhecidos despertou a curiosidade do atendente para o homem que chegara. Quem seria? Alcovitou à mulher que enxugava os copos. Parece um desses que vem da capital, mas parece meio sonso, pontuou. Sim, queria café mesmo e ia pagar com as libras, mas o atendente estranhou aquela nota brilhante. Falsas?! As espalhou no balcão, mais pelo susto que pela desfeita. Nhô Lica juntou uma nota e conferiu. Não, não valia nada mesmo, meneou a cabeça e olhou para o inglês que sacou do dicionário e se enrolou todo. Então Nhô Lica, à moda brasileira e que falava francês, tirou do bolso algumas pedrinhas, pagou o café de Watson e ainda lhe pediu um salgado.

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