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O blog atém-se às questões humanas. Dispensa extremismos ou patrulhas. Que brilhe a sua luz. Bem-vindo e bem-vinda!

sábado, 4 de dezembro de 2010

A expectativa de final de ano e de férias movem o trenó de papai noel e vejo por bem publicar alguma coisa afim do mundo de criança como a que posto hoje e publicada no A Tribuna Piracicabana também. Agradeço aos meus seguidores e leitores, aos amigos que saboreiam prosas e a todos que neste ano sustentaram nossos sonhos e realizações, neste tempo de pré-férias acho que voltamos a ser + humanos um pouco; nessa vida corrida para ganhar dinheiro e sonhar, não somos máquinas e o tempo se esvai. Bom Advento a todos.


Papai noel virá?

Pela veneziana quebrada via o céu noturno. Estrelas desperdiçadas pelo meu sono, uma lua que se virava pelos cantos do firmamento. No parapeito da minha janela que dava para a rua, o meu burrinho feito de batata com quatro palitos enfiados. Era o meu poder de barganha para ganhar algum presente, porque no ano todo fizera muitas peraltices. Tentaria não dormir para me explicar pessoalmente ao bom velhinho, quando chegasse.
Ele vinha sempre de trenó e de muito distante. Passava com suas renas, um cavalo do pólo norte, só que diferente – diziam-me. Ah! Deixava marca de estrelas pelo céu, porque esses cavalos eram mágicos e voavam e, em minha expectativa, eu também. A espera pelo papai Noel. Mesmo que não viesse com o presente desejado, daria alguma explicação por não me dar a bicicleta que eu pedia todo o ano. Para mim, aquele veículo era o máximo, aqueles pneus com raios finos suportando meu peso de gordinho. O problema seria equilibrar-me em duas rodas, precisaria de no mínimo três. Mas papai Noel devia saber disso.
Fui posto na cama à força, hora de criança dormir. Meus olhos estalados não saíam da veneziana. Passei quase toda a noite em claro, a pressentir os movimentos e barulhos da chegada do trenó. Meus pais dormiam noutro quarto e meus irmãos dormiam como bebês. Estava sozinho no meu mundo, insone. Pela veneziana ouvia um rodamoinho noturno, levantei-me algumas vezes e via a noite pela fresta. O cachorro amontoado, dormindo. O silêncio pairava preguiçoso, suspenso nas nuvens altas e brancas que vagavam nas brisas, as galinhas empoleiradas e imaginei o galo de pijamas, o sol ia demorar a nascer. E o papai Noel?
De dia, disseram-me que o velhinho tem de entregar muitos presentes e nem sempre chega a tempo ou conversa com a gente. Andava eu já pelo terreiro, sem temer noite, enquanto o papai Noel não chegava. Descobri que as aves dormem e os outros animais também, só não sabia com o que sonhavam. O cachorro levantou a cabeça e vendo que era escuro enrodilhou-se novamente. Tudo muito quieto. Voltei para debaixo das cobertas, sem ninguém me mandar. Agora já conhecia a noite do quintal.
Sonhar dormindo é normal, mas bom é sonhar acordado. Cochilei no travesseiro, mas sonhava que estava com os olhos abertos na veneziana. Quanto mais esperasse, mais demoraria. Então fui imaginando o prazer em ter a minha bicicleta. O guidão, os pedais, as rodas raiadas fazendo rastros na estrada de terra macia. Ia pôr até uma caixinha atrás para levar brinquedos meus. Ia ser minha redenção da vontade de passear, ir aonde meu pai não levava e minha mãe nunca deixava. Os meninos iam ficar admirados, eu ia ser respeitado com aquela magrela, presente do papai Noel. Mas acordei no dia seguinte e cadê a minha bicicleta?
A que tenho hoje não é como a que o papai Noel não me deu. Então tive de aprender a viver sem ela. Afinal, uma bicicleta não é tudo, mas valeu. Será que uma bicicleta é tudo isso? Onde estão os presentes que ganhei? Presente de criança só tem valor na hora, depois esquece pelo quintal, como fiz com meu cavalo de brinquedo e meus montes de terra, que ora junto para brincarmos neste pequeno espaço gráfico.

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