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O blog atém-se às questões humanas. Dispensa extremismos ou patrulhas. Que brilhe a sua luz. Bem-vindo e bem-vinda!

sábado, 24 de setembro de 2011

Divulgação: Estivemos ontem no lançamento do livro neu, de Irineu Volpato. Tomamos contato mais próximo com sua obra. Sua poesia é forte, tem traços do homem do campo, de um linguajar essencial da gente da terra e de sábias metáforas que apreende das árvores. É um poeta maiúsculo, de estirpe, de luz e amanheceres. Parabéns. Eis um trecho:


"céu brabo pra chuvas


e as folhas de pitangas


insistem em sorrir


é tanta chuva há tanto tempo


que os troncos do pomar


estão vestidos limo

A máscara do Zorro – vc se lembra?
A polícia montada de Los Angeles, EUA, na tarde de ontem, prendeu um homem que se fazia passar por surdo-mudo. De carroça, o mímico carregava o figurino do rebelde Zorro. O rebelde ia voltar a agir, pensaram. O mágico amador sumiu em meio do caminho e sobraram somente alguns vestígios, uma máscara e um bilhete para Disneylândia.
Na época ninguém desconfiava da identidade do Zorro. Um fidalgo que estudava esgrima na Espanha. Um Quixote que se deu bem no novo mundo a custa dum criado e dum pai rico. Eram dois, Diego, que tinha o dom da esgrima e o alter ego surdo mudo, ouvinte, mímico, mágico, roupeiro e cozinheiro, Bernardo. Os inimigos eram homens maus, todos de bigodes e meio parecidos com Diego de La Vega. Com cargos de comandantes e generais faziam o mau por ambição, oprimiam o povo. A justiça estava nas mãos débeis de um sargento gordo, ingênuo e ébrio e nas do justiceiro noturno. O povo eram os camponeses, servidores das estâncias e alguns índios que restaram por ali.
Descobriram que na casa de um tal Alessandro se tramava política. O dito surdo-mudo usava passagens secretas por trás de guarda-roupas, cristaleiras e outros móveis, para passar de um anexo a outro da residência e lá escutar os planos dos inimigos, em cujos ouvidos sortudos sempre se faziam ouvir. Desconfiava-se que o sargento gordo do povoado dava cobertura ao bandido por alguns copos de vinho e por boa conversa. O cabo que servia com o dito comandante via-o sempre na taberna a beber. Há indícios de que o Zorro queria conquistar a Califórnia e depois o mundo moderno, como defensor dos pobres e oprimidos.
Esgueirava-se por trás de uma ramagem, onde treinava o seu animal, arredio a estranhos. Um esconderijo bem camuflado e de onde surgia sobre a montanha em seu cavalo negro, empinando, empunhando a espada a tocar o céu e a fazer descer raios. Descia à noite sobre o vilarejo para abrir prisões e marcar a grafiteiro o seu Z por todo o canto. Os adversários não morriam pelas suas mãos. Não assustava as crianças! Quando morriam era por alguma queda ou acidente que causavam a si mesmos. Zorro limitava-se a marcar-lhes o destino. Acordavam com o Z na testa ou nos fundilhos.
Fazia a maior bagunça nas hostes inimigas. Subia sobre os telhados do quartel, escapando de tiros dos soldados, escalava muros e paredes, enfrentava vários soldados ao mesmo tempo, derrubando-os num só golpe – é a força do mito. Um pequeno tombo já os punha a nocaute! Nós, crianças, não percebíamos. No chão a espada dele valia por dezenas das dos soldados e depois, subia o muro novamente, desviando de algum eventual tiro, pelo alerta inadvertido de alguma ordem de fogo de um sargento atrapalhado ou de um comandante colérico. Sempre escapava. No alto, a um assobio que só o seu cavalo ouvia, a montaria se postava do lado do muro alto e branco do quartel, conforme o combinado: espreitar o momento oportuno numas das ruelas sombrias, com as orelhas em pé, a ordem de comando, o assobio. O cavaleiro, num salto de pernas abertas, cai das alturas sobre a cela novinha e vai embora zombando dos adversários que os acompanhava pelas pradarias, numa corrida de cancha reta, onde só o mascarado sai vencedor. O cavalo do Zorro corre mais, é mais bonito, elegante e por fim, quando cansa da brincadeira a despedida, fazendo a corte com a espada: Adios, senõres!
e-mail para contato camilo.i@ig.com.br
Autor de O Efeito Espacial e de O Seminário e aos interessados ainda temos exemplares...

sábado, 17 de setembro de 2011

Grato aos visitantes e seguidores ao blog, e por isso hoje, às 07:00 pontuais posto este texto sobre... comentem
Dr. Conan Doyle - ficção
Devido aos meus males de terceira idade passei por vários médicos. Soube de um inglês e consegui através de um amigo a consulta. A sua sala de espera era ao estilo vitoriano, trouxera a mobília da Inglaterra e fazia a gente se sentir naquela época, da rainha Vitória, em que “se dava para distinguir bons dos maus na sociedade” – éramos os bons, claro!
Meu amigo foi junto, afinal a anamnese do meu caso era importante e o diagnóstico de desmemória era clínico, sem exames laboratoriais - às doenças deste século os remédios daquele, dos tempos da rainha Vitória. Voltei no tempo ao entrar no consultório.
Esperávamos diante de um enorme relógio clássico de estojo talhado e de madeira cheirosa, destes que fazem o tempo virar época. Aguardava perto de um senhor que me olhava simpático, com bochechas vermelhas ao rubro, com cara de leitãozinho desmamado e de espírito anglicano, o das horas certas – não vi celular, óculos de marca com ele, mas uma corrente dourada pendente do colete de um possível relógio do bolso interno. Achei-o suspeito quando vi meu amigo de olhar investigativo, conjecturando. Tinha um caso de um tal inglês, assaltante de bancos que se passava por cidadão comum. Socorri-me da ansiedade numa bandeja de prata com biscoitos amanteigados, mas não pude deixar de perceber o aroma da cozinha – café! Peguei uma xícara para mim e dei uns goles ali mesmo com o nariz encostado nas bordas. Meu amigo Sher, seu apelido para brasileiros como eu, aguardava britânico, austero com sua bengala, a hora exata da consulta.
- você quer café? – o silêncio em sorriso, me fez arranhar o inglês (you want drink coffe?).
Assentiu, não respondeu. Levei-lhe uma xícara. Não fez como eu, pegou-a pelo pires e me olhou inquisitório e direto, em português:
- Você sabe, já lhe disse, eu não tomo café, você esqueceu?
O café ainda fumegava diante de seus olhos frios e distantes, de uma era em que tudo tinha precisão, dizendo por fim:
- A mim cabe uma chávena, no entanto. Thank you.
Às 8h30min fomos chamados à consulta. Um senhor de bigodes escovinha gasta e olhos interrogativos nos recebeu, pontual. Na sua mesa muitos papéis que rabiscava na falta de pacientes que se atrasavam ou não vinham. Escrevia histórias de ficção. Nem ousei dizer que tinha a mesma mania, ia parecer obsessão e mau diagnóstico para mim, mas minha memória foi se recobrando ao ver esse encontro deles:
- Sherlock Holmes!
- Sir Conan Doyle!
- Oh, meu amigo, depois de publicar minhas aventuras no jornal de Londres, estou procurando um matutino aqui.
- Esqueça. Seus textos são longos demais e aqui não tem espaço.
Ah, caros leitores, meu mal é falta de memo... me... Gaguez, pronto.
Nota: Conan Doyle, autor de literatura policial, do ficcional Sherlock Holmes, publicava no Jornal de Londres e encontram-se estas publicações disponibilizados, com ilustração de época, no site
www.Sherlockholmesbr.vilabol.uol.com.br/afaixa.html


Aos interessados pela literatura de nossa autoria, contate-nos pelo e-mail camilo.i@ig.com.br e encomendem por correio ou pessoalmente, com dedicatória, os nossos livros ou peçam as sinopses. Ei-los

sábado, 10 de setembro de 2011

Duas palavras

Neste feriado de sete de setembro estivemos aqui em Piracicaba o show do Mazinho Quevedo e Tinoco, com seus noventa anos. Seu carisma é admirável, sua força e disposição para lutar pela cultura raiz, do homem simples, a genuína. Na última vez que o vira, há alguns anos quando autografou um cd para mim eu estava falante e disse-lhe do meu pai que gostava dele e ele perguntou "onde ele mora?", coisa de caipira que conhece o lugar e conhece a pessoa e para homenagear vide o texto abaixo, Duas palavras.
(Ao lado, quadro do artista piracicabano Almeida Junior, Caipira picando fumo; que serviu de capa de cd de Rolando Boldrin e outros.

Duas palavras
- chove?
Pensei que ele não tinha ouvido, mas ouviu sim. Um ventinho refrescante soprava na noite cálida e da porta baixa nós proseávamo
s sentados em toco. Vez ou outra Kaiú espiava dentro da casa, longamente, seus olhos corriam as paredes de pau-a-pique, uma sacola dependurada, uma janela tramelada, mais ao fundo o fogão com o tição guarda-fogo, o estalos da lenha teimava e a natureza falava por si.
Depois voltou os olhos mais calmos, não carecia de dizer nada; mas um homem da cidade não suporta tanto silêncio, dei algumas tossidas de alerta, que o Kaiú estranhou. Achando que era algum pedido, o caipira pegou-me mais uma caneca de café, mas agradeci com a mão, também me calei de boca. Insistiu mostrando que pegara para mim e a tomei aos goles, soprando baixo o café fumegante.
No galinheiro ali pertinho era um silêncio divino, a noite punha-se no ninho das carijós. O homem estava satisfeito com o luar de feitiço e com o clarão do terreiro de chão batido e limpo, varrido. Pelas bandas dos eucaliptos viam-se algumas aves selvagens amontoadas nos galhos. Bem, achei ter visto alguns quatis ou outro bicho correndo à sorrelfa. Kaiú dava uns sorrisos de encantamento, sem esforço e sem o saber, ao observar os animais fazia menção da presença dos mesmos com gestos de cachimbo, como a incensar a mata.
Parecia que o caipira segurava as nuvens passageiras atrás dos eucaliptos com os olhos, enquanto fazia de fora sua sala de visitas. Eu achava que ia chover, mas depois do passeio da lua entre nuvens escuras que se abriam às estrelas mudei de ideia, chover não ia. Precisava ir-me do toco e ele disse por fim:
- Pruquê?
Eu também sou parte desse rincão, no mundo do caipira há lugar para todos. Já estou com saudade de voltar lá para conversar com o
Kaiú.

sábado, 3 de setembro de 2011

Amigos, grato pela centena de acessos. Hoje, nesta manhã fria, posto um texto que ressuscitei da minha gaveta e descobri nele algo novo, espero que também o descubram. Essa luta homérica do homem contra as adversidades e dificuldades cotidianas de encontrar-se consigo mesmo e sua força o torna bizarro e projeta-se num personagem de TV e se a roubam?

O personagem poderia ser talvez Hércules (grego), mas o Sansão veio como nome e se encaixou bem como verão ou não (rsrsr).

O sono de Sansão
Ficara dormindo na madrugada fria. O barulho do interruptor na cozinha entrou nos seus sonhos, mas esse breve acordar o reconduziu ao travesseiro – ela está pela casa, acho que vai aprontar o café mais cedo. Do lado, o travesseiro afundado e quente com alguns fios negros dos cabelos dela, exalava o cheiro característico de sua presença, que ainda que distante sente.
Se levantasse, faria ele o café. Lavaria a louça e cozinharia o feijão de molho, daria jeito na mistura e faria um arroz com um alhinho bem frito no amarelinho do azeite. Mas hoje ela se dera ao trabalho, não fora às aulas. Inda bem que desta vez a esposa não usava os seus saltos, mas pisava como que em plumas – estava mais cuidadosa pensou. Meio sonhando e dormindo ia tecendo o ambiente que a mulher perambulava, penteando-se, maquiando-se ou puxando a descarga. Era porreta, não sentia frio quando tinha alguma coisa para fazer, levava tudo a eito. Dava-lhe alguns carinhos quando passava pé ante pé pela cama, mas ele meio grogue a via nas cobertas retorcidas ao lado. Mexia-se muito à noite e ela tinha de dar uns trancos nos ombros para ele se aquietar, mas naquele dia estava calmo. A porta da frente bateu e ouviu uma chave virar no trinco, fora-se.
Por certo, deixaria como sempre faz, um bilhete dentro do seu sapato ou gaveta de cuecas – era assim amável e gentil. O cachorro nem latiu e já teria comido sua ração e recebido o afago das mãozinhas dela e agora, com o sol alto, se aquecia deitado no chão atrás da casa. O vizinho também fazia silêncio, os pássaros cantavam distantes, sem a algazarra da manhã. Teria de levantar, mas a cama estava boa. Foi abrindo os olhos devagar. Ela trocara a cortina e mudara alguns móveis de lugar. Esticou o braço e não encontrou o interruptor do abajur, ela tinha o tirado de cima do criadinho mudo também. Enquanto dormia, mexera no seu mundo, irou-se - o que, num acesso, lhe fez jogar a coberta longe. Já era tarde. Dormira demais. Dalila! Sua malandra, olha o que fez! Mudou tudo dentro de casa.
Não tardou e começou a ouvir gritos na rua em frente a sua casa. Homens armados invadiram a casa pelas portas arrombadas. De pijamas, pensou que fosse sequestro por bandidos disfarçados de policiais.
- O senhor tem o direito de ficar calado, se disser algo será usado contra o senhor – emendou um deles.
Como se calar! A esposa tinha saído mais cedo e poderia ter sido assaltada.
- Assaltada, sua esposa?! Ao que consta no chamado, o senhor é solteiro e foi assaltado, posto na cama por uma coronhada, não se lembra?
Ainda perguntaram seu nome e ele disse o de sua imaginação - Dalila; o dele...
Um B.O. de roubo de TV foi lavrado, a vítima Sansão Da Lila.