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O blog atém-se às questões humanas. Dispensa extremismos ou patrulhas. Que brilhe a sua luz. Bem-vindo e bem-vinda!

domingo, 30 de outubro de 2011

Amigos, espero que curtam esse texto, porque não tenho outro, rsrsrsrs.


A alma dos gatos
Na minha infância ouvi falar. Nunca peguei nenhuma alma na mão, como ia saber? Aos adulto
s era uma questão comezinha, eu nem bem afeito ao mundo concreto, tudo de fora era inusitado e objetivo e se não podia brincar um pouco, não me satisfazia. Era um espírito indomável, de difícil distração, mas de fácil encantamento, qualquer mentirinha bem contada me enlevava, era assim que me punham para dormir depois do banho, porque me sujava muito, rolava no chão ou na lama, amorfo sem me cobrir com nada naqueles tenros anos.

Almas...
Na igreja cheia de imagens e teto enorme tinham lá as ditas cujas, as dos santos, as do mal ficavam fora, pelas capoeiras, embaixo de cama de casa mal assombrada ou escondiam-se na casa da gente, esperando para agir. De tanto ouvir, e não ver, foi que essa ideia de alma me tomou a cabeça cabeluda. Andava com meus brinquedos caseiros, nada de plástico naquela época e já via saci, crianças do limbo e muitas outras almas. Eram as mal morridas, que não morreram direito, deixaram uma missão para cumprir. Missão? Mal sabia que já estavam criando uma para mim, talvez a de padre – na família não tinha nenhum e isso entraria como proposta de realização e para elevar o status da família. Queria mesmo era ser um Macunaíma.
Procurava as almas pelos cantos e era de família bem católica, nada de espiritismo. Zanzava aos chutes de pedrinhas, de o chão riscar com algum galhinho e a bater descompassado num mundo aleatório de ideias infantis. Sim, nem falei, mas os gatos andavam por ali, uns brancos, rajados, amarelos e assim, assim – soltos, sem coleirinhas vermelhas ou leite no pires, se viravam como podiam, na sorte das crianças ou das caneladas dos adultos. Caso é que vi um deles morto. Decompunha-se, pude ver a dentição rígida, parte do interior da cabeça, sua última expressão. Para onde fora a alma dele? Voltei várias vezes lá, até que os adultos o enterraram sem cruz, sem nada, para quê? Gatos não têm alma, diziam inquisitórios. Mais uma vez fui enganado, como veria uma alma de verdade?
O tempo passou, cresci, fiz-me homem; nestes dias, cheguei ao trabalho e no abrir das cortinas lá estava o gato no parapeito dos janelões. Que susto! Dentro era fechado e por onde entrara? Alguém o pôs lá. Não sei, porque ao me virar já não mais se encontrava, somente sua alma e o cheiro do bichano, talvez eu mesmo o tenha posto ali com minha alma que passeia e assim fiz, alongando-me os olhos pelas calçadas e ruelas de divisa, a cidade invadiu nossas mentes e as almas de entremeio. A alma deste está salva, mas agora sei, o mundo tem paredes de vidro, a prova-de-almas.

Onde está? Talvez acima, talvez abaixo deste mundo de De Chirico, de gaguez obsessiva, contraperspectivas, de íngremes telhados, de áreas cinza, de silhuetas. Estará no cume de uma abóbada ou no alto de uma bandeira sem pátria, nos jardins contorcidos ou de esquina, a ver o mundo que nos assola. Mas, meu Deus, é um só um gato!

sábado, 22 de outubro de 2011

Anos incríveis.


Amigos, esta semana reecontrei muitos irmãos que estudaram no seminário religioso capuchinho em 1981-1982, no facebook é excapuchinhos. Nós, os sem-vocação para conservadores, fomos como folhas juntadas numa rua sem-saída e que um vento bondoso nos espalhou nas diásporas, muitos destes amigos e irmãos estão hoje casados ou não, exercendo suas profissões e são até onde sei bons cristãos e pessoas prestantes à sociedade. Homenageio com este quadro de Chirico ao lado, este pintor fazia suas pinturas com perspectivas destoantes, de propósito, para evidenciar a percepção contraditória que se tem. Nem tudo está na nossa perspectiva, nem nos é previsível, mas tudo pode chegar a bom termo dentro de uma espiritualidade desenvolvida. Nossa missão não é mais "salvar o mundo", rsrsrs, é a de ser humanos na humanidade de Cristo, a Lei fundamental do cristianismo, o Amor. Como todos, creio, tenho muitas recordações da casa de formação e de muitas ocorrências, afinal, eram anos incríveis!
Chove sapos
O sapo resolver ficar atrás das folhas. Com os olhos semicerrados, escuso, dormindo para quem vigia e acordado para quem sonha. O mato é seu lar, o rio o seu refrigério. Sapo não engole sapo, engole moscas. Verde, dentre verdes nem sempre, com seus olhões desapercebe-se entre folhas e relva, sem atrativos para quem vive nos ladrilhos secos.
Atrás de folhas verdes e amarelas e alguma rosa que desponta faceira, enfiou-se por lá, perto ao enorme vaso, abundante em folhas e generoso de terra. Coaxar ainda não. A noite caiu e as estrelas apareceram nos céus, vozes e gritos de crianças pelo corredor, mas o sapo está em silêncio a engolir seus pensamentos. Nada o demove desta noite de natal.
Quando chegou não se sabe. A qual pretexto também não. Se veio pelo muro ou portão ninguém viu. Um ser solitário e entrão, que busca lugares onde não possa incomodar, mas o engraçadinho pergunta: entrou de sapo?
Anura paciência de quem herdou o papo, mais não fala de sua sapiência. Conhece as estrelas, mas nos pântanos a névoa branca da madrugada passa e depois lá, ainda resta aquele ser de olhos dormitantes.
Fica a olhar a menina que deita água nos vasos de manhã, em meio aos cantos das aves nem o percebem, verde entrefolhas. Sonha com a menina. A água do regador lhe cai fria e sua pele úmida respira como se na lagoa estivesse. Há tantos dias que saiu que nem mais se lembra. O sapo envelhece sem perceber, é assim. Sabia que veio pulando na noite e se encantou com aquele jardim. O sapo sabe a diferença entre velhas bruxas e princesas, aquelas o cozinham aos poucos em poções mágicas, estas se casam com ele.
O que quer da vida? Era um simples sapo de jardim, escondido sob a paisagem de uma família estranha que toma café. Doutro lado de sua visão está uma escultura de sapinhos e a mãe sapo em pedra. O chafariz borrifa neles, inofensivos, débeis, imóveis, limpos. Há dias em que a chuva cai e pode coaxar ao mandador de chuvas, ao grande sapo que está no final do arco-íris, assim crêem os sapinhos; este não sabe bem como vêm as águas de cima, mas se alegra. Às vezes, não saber nos inspira as mais profundas capacidades, seu primeiro coaxar foi numa garoa de setembro e perto da janela dessa menina. Ela abriu a janela, procurou com os olhos, fez um olhar de não sabia o quê e fechou a janela por onde se via sua silhueta pelo quarto iluminado por um abajur somente. Dormiu lá dentro, enquanto ele coaxava lá fora. Talvez achasse como muitos, que chovia sapos; mas a água é a alma desses anfíbios.
Por isso, meninos, se ferver a água do planeta eles morrerão em suas lagoas. Mas por enquanto podem brincar nos lagos, a bruxa do caldeirão não chegou.

sábado, 15 de outubro de 2011


Vagido - o caso de Felipa
Um lugar ermo de sol a pino, cheio de dejetos desprezados pelos humanos, o cheiro denunciava o lixão. Um cenário mal feito, rude, amontoado de coisas, sem pontos de perspectiva, uma desolação de nada de se ver, além de alguns urubus e gatos, que esfomeados perambulavam. Focos de fumaças de alguns montes de dejetos, de combustível, óleo ou produto químico de cheiro forte que queimavam o ar, como assopro do diabo. Era um sheol, um silêncio dos infernos. Um calar de omissão, de absenteísmo, de desilusão, de tormento introjetado. Este som do vácuo, das depressões. Um som do absurdo no ar já tépido, onde nunca encontrará eco ou ouvido que o ouça, a não serem os ouvidos absolutos. Nada por se aproveitar, lugar de desova de inutilidades, próximas a desintegração, de mofo, nem recicláveis eram. Ver aquela tristeza era um tempo perdido, uma coisa chata, inda mais naquele sol de se encontrar gente, sim gente, gente ao sol, escorrendo o suor como cera de uma vela quente, que ia se acabando. Eram catadores. E no meio ermo, abaixo dos escombros quietos um vagido. Era como o primeiro assopro de Felipa. Uma menina, braços gordos de neném batiam nos plásticos velhos, lugar escuso onde a depositaram por descuido. Deus que protejam os sonhos dos descuidados, por que de lá um cãozinho puxou a criança para fora, enquanto o entulho cedeu. No caminho ficou o bebê lambido carinhosamente pelo animal. Conteve o vagido de fome e via o ente peludo e materno sobre si, a lua veio sobre o lixão, como a se assentar sobre um oásis. Felipa ainda não sabia quem era e o quadrúpede a protegia. Dormiu ali com ela na noite. Por fim, um homem em roupas rasgadas, como um tordilho humano, a viu. Era uma criança. Retirou o filhote de gente das garras do cão, assustado, com medo de que a fizesse mal. O cão já ia regurgitar alimento de sua boca já por adotar como sua cria. Mas uns chutes do dono o fez seguir o enredo de longe. O fato de repercussão notória ganhou as primeiras páginas dos matutinos. Um assunto que rodou de boca a boca. Da rodovia as pessoas olhavam de seus carros e Vans o local do acontecido, como a sentirem as emanações daqueles momentos, como um conto bíblico. Era aquele lugar! Ainda teria algum vestígio da menina lá?! Abaixo, no local, era um lugar de esquecimento mesmo, viam-se alguns esparsos catadores, alguns debaixo de seus chapéus de largas abas e outros debaixo da sombra do desespero, pegando tudo que achavam e, por vezes, levando a boca alguma sobra. Os “irmãos” de Felipa também perambulavam de pés descalços por aquele chão de um mosaico triste e pontiagudo e de vitrais góticos e quebradiços, abandonados, que entra no coração dos passantes desavisados como ogivas. Foi-se o vagido nos braços de alguém. Ganhou um lar e um nome a criança. Cresceu. Quando está triste não lança os brinquedos para o lixo, porque sabe que o seu cachorro vai buscar e trazer o presente que não quer. Ficou moça. Aquele cão que aparecera ao acaso seria o mesmo que a salvou em criança? Não o sabe ao certo, mas é ele que a tira dos escombros do dia a dia, dando seus latidinhos e choros de saudade, pulando nela e lambendo-lhe as mãos. Não vou descrevê-la, preservarei sua identidade, mas Felipa vai pôr o lixo na rua hoje e está grávida.

sábado, 8 de outubro de 2011

Domesticaram o lobisomem!

Ao lado, Belinha. Uma cachorrinha tímida que pegamos pelo Viralata Vira Vida. Ela posou para este desenho e vai parar numas das páginas das Ciladas do Androide, meu próximo livro - se Deus quiser...

Ponto de leitura .

o PONTO de leitura GARAPA cedeu o espaço para leitura e discussão do livro A menina do Bairro Fria de Luzia Stocco. Agredecemos a presença brilhante de todos e a disponibilização desse espaço pelos nossos amigos peões do Andaime.

Domesticaram o lobisomem!


Uma amiga me contou que lá onde morava, nos confins dos sertões, tinha um lobisomem. Quar? - me indignei. Era perigoso? Não lá, me disse, esse era bonzinho, feio, mas bonzinho, todos sabiam de sua identidade secreta de lobisomem e fingiam que ele era normal. Este gostava de contar histórias e ela, criança, o ouvia no seu colo. Exceto em noites de lua cheia. Daí o contador sumia e as pessoas ficavam quietas à luz de alguma lamparina, vendo a lua pela janela; o seu chico não era encontrado em casa, nem nas vizinhanças, a mulher vinha dormir com a vizinha e no terreiro era um forrobodó de poedeiras e chocas, mas nada do marido da tal aparecer.
No dia seguinte aparecia, com algumas manchas e escoriações e não se lembrava de nada; ele não sabia que era lobisomem (espero que ele não leia este texto, nem minha amiga). Um lobisomem diferente, ele até contava histórias dele e tão bem que parecia estava revivendo aquilo num lampejo, uivava como um e as crianças riam. No final da história ele fazia o cachorrão de quatro patas e ia dormir como humano, as crianças já tinham passado para o sono e recolhiam-se protegidas em suas fantasias do bem.
Aqui na Piracicaba “véia” tinha um, rondava galinheiros, chiqueiros e mexia até com as nuvens do céu, quando aparecia vinha ventos fortes que balançava todos os ramos das arvores. Quem conta é um caipira, amigo meu, o Virso, mas que não aceita falta de educação. Se viu, é porque viu, ué! Fui com ele caçar a fera. Na verdade não acreditei muito (ele não vai ler este texto mesmo, então vou falar). O local do ataque do animal era a rua do porto, de madrugada, o bicho rondava e espantava as capivaras, mexia com os pilares da ponte e queria subir no elevador com suas garras. Quando vi o homem colocando bala de prata no revólver, tentei acalmá-lo. Ora, deixa disso, disse ao caipira, isso é lenda. Não o dissuadi. Se tem uma característica de um verdadeiro caipira é a persistência na sua decisão. Fomos.
Vimos vários bonecos do Elias derrubados, reconheci alguns pela roupa, eram mesmo do Elias e algum animal passou como vendaval ali. Não adiantou, o caipira farejava para encontrar o tal, balançando a arma com porte especial para caçar lobisomem. Eu tremia, tossia para espantar o medo, mas era “paura memo”. Entravamos na mata fechada, um calango passou e nem viu meu pé, chutei o rabudinho para longe e continuamos. Demos várias voltas na mata e no Salto e nada de lobisomem. Vamos a uma lanchonete comer alguma coisa, Virso – enfatizei. Mas e o lobisomem. Tá em casa, no meio dos livros, como este daqui, abri um. Olhou, olhou e abriu os olhos, arregalando. Você tirou até foto e depois disse que não tem lobisomem? Nesse instante vimos alguma coisa se mexendo e o Virso tirou o revólver e apontou. Sai daí, senão eu atiro, seo Lobisomem. O bicho veio brabo e ele atirou à queima-roupa, digo à queima-pelo. Na sombra do parque a coisa rolou e fomos juntar lá embaixo o tal. A bala de prata? Bem, esta era de festim e por um descuido nosso o lobisomem evadiu-se. Nós fomos parar no distrito policial. Essa de porte especial de arma para caçar lobisomem não colou. Agora eu acredito em lobisomem, mas não ando mais com o Virso!

sábado, 1 de outubro de 2011

A tartaruga e o boson PI

Esta foto não tem nada a ver com o texto, mas é impressionante!
A fotografada não vai achar ruim de postá-la aqui, então ei-la.




Esta jovem de olhos brilhantes é a grande Polly, filha da Luzia e nossa criança.
Lembranças a Floripa!




A tartaruga e o bóson PI *




Advertência: CUIDADO! ESTE TEXTO NÃO TEM LÓGICA NENHUMA!
Horácio perdeu a tartaruga de estimação, a amarelinha, de pintas amarelas no casco preto. Ora, não eram pintas, é que ela passeava enquanto Seo João pintava a parede e... as pintas passaram a fazer parte dela. A tartaruga fazia parte da memória de Horácio, mas o quelônio para se manter vivo se escondia dele, um aloprado que espantava até os ponteiros do relógio. Assim era, deixava pegadas que nem o próprio percebia e pela casa, depois que a esposa passava pano úmido no chão, marcas de chinelas, a trilha até a geladeira.
O esquecimento é feito de atos inconscientes de Horácio e as lembranças também, a memória é interligada. Quando viramos tartarugas nos escondemos nos cascos pré-históricos e vivemos muito tempo, quase eternos, por alguns momentos ilusórios e não temos tempo, ocupados em frustrações. Horácio quer saber por que sua tartaruga não tem o casco como as de todo mundo; decerto não pagou ao pintor seo João, esqueceu.
Ia me esquecendo, mas deixei a porta do banheiro aberta e a lâmpada não acendeu, não sei não (?), esse daqui não é meu banheiro (!) As pequenas coisas já estão obsoletas, esquecer é um luxo a quem pode lembrar-se de grandes coisas, mas... “foi o tempo que você gastou com a sua rosa é que a fez tão importante” – Antoine Saint-exupery, em O Pequeno Príncipe; ou com a sua tartaruga, cachorro, ou sei lá o quê.
Não, o medo, a insegurança, a ansiedade nos faz esquecidos e damos importância a coisas passageiras que se tornam absolutas. O estresse torna de mente o que é de acaso, não flui, temos de deixar o tempo escorrer e o universo completar o ciclo em nós – a memória é recorrente e sincrônica, perder uns passos pelo jardim e saracotear as pulgas velhas do corpo. Um banho é um santo remédio e nada de pílulas, tome água pura, esqueça o terno passado e ponha a camisa amassada sem reclamar. A vida não tem lógica, tem sentido, mas onde eu estava mesmo? ãh? Perdi minhas tartarugas outra vez, será que as acharão ou fugiram com as do Horácio?...
Nota ao pé da página: Bóson PI* é o nome de uma subpartícula atômica em estudo pelos cientistas, e por que o título deste texto? Ora, o que é mais rápido que uma subpartícula e mais lento que uma tartaruga? Perdoem-nos a ilógica, mas não temos nem o Bóson PI, nem tartaruga nenhuma, somente ideias de suas existências. Vc viu alguma tartaruga ou coelho?
acessem também o
www.camilotextos.blogspot.com, hoje vou postar lá Agatha, a rainha e o Alce, vão para lá também e comentem este texto de crítica; os de crônica, posto aqui.

Amigos, estive nesta semana na Nobel do centro aqui de Piracicaba, uma livraria de franquia e conversei com a gerente, que me disse que deixa um lugar reservado para escritores piracicabanos, o meu lá não se encontrava - estava para fazer acerto. Não me incomodo com acerto, mas ela ciosa de suas contas quis se antecipar. Se você, piracicabano ou não, for à livraria, existe uma gôndola, escaninho, com os livros de expressão genuinamente nossa, de Piracicaba; não que seja melhor que a dos outros, sem querer comparar, mas só para dizer, que a nossa literatura também existe e fica nos fundos da loja, num cantinho que pode ser aconchegante, vá lá é nós que fazemos o nosso espaço, sombras se dissolvem com a luz.