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O blog atém-se às questões humanas. Dispensa extremismos ou patrulhas. Que brilhe a sua luz. Bem-vindo e bem-vinda!

sábado, 31 de dezembro de 2011


Paixão por orelhas
O gosto por partes do corpo não sei se é doença, mas alguns obcecados viraram personagens de textos como este. Como aquele rapaz que gostava dos braços de dona Severina, do conto de Machado de Assis Uns braços - É a história de Inácio, jovem de 15 anos que vai trabalhar como ajudante do ríspido solicitador, funcionário do Judiciário ou algo entre procurador e advogado, Borges, morando na casa deste. É lá que acaba se encantando com os braços de D. Severina, companheira do seu patrão.
O meu personagem, não o Inácio, era fissurado em orelhas, devaneava em ver uma, o primeiro olhar de flerte era nas laterais da cabeça. Se a moça estivesse com os cabelos soltos, ficava imaginando como desvelar, conhecia-as pelas orelhas, gostava das dobrinhas. Orelha pequena, safada e meiga; orelhas grandes, exibida, de muitas trocas de brincos e aí ia nessa fantasia tola.
Perdeu várias pretendentes por mordiscá-las na parte mais tenra do lóbulo, era um machista, preferia as orelhas pequenas, brancas, indefesas e dava mordidinhas. As suas não eram assim bem cuidadas, andava com peluchos e cera vencida e ouvia somente aos seus instintos e às orelhas dos outros.
Enamorara-se com uma moça de orelha fininha, bem torneada (se é que se pode usar o termo), de traços bem feitos e vincados, um sorriso enchia-lhe o rosto de sangue e vida e com aquelas orelhas era o toque final de Deus. Quando punha os cabelos cacheados por trás, parecia-se com os elfos e ria do nada, ria simplesmente, isso alegrava o apaixonado.
Dizem os acupunturistas que a orelha representa todo o corpo embrionário, o feto, aquelas formações retorcidas e duplas. As agulhas são colocadas nelas que refletem nas terminações do corpo. Um dia o rapaz disse à amada aquilo que não o conseguira até aquele momento, ela não o deixava, encabulava-se e então desta vez declarou-se a supetão:
- Vou lhe contar do que mais gosto em você. São nada mais, nada menos que suas orelhinhas.
A moça pareceu ouvir e ia dizer que:
- ...
- Orelhas, entendeu, orelhinhas, muu,mu.
E ela lhe deu orelha। Ah, esqueci de lhes contar, era surda-muda.


Amigos, acaba de chegar da gráfica As ciladas do . Os que tiverem interesse me acesse no e-mail camilo.i@ig.com.br e reserve o seu exemplar, posso enviar por correio num endereço fornecido e o valor pode ser depositado em conta.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011


Vide sinopse e se gostar do tema, acesse-me pelo e-mail: quartarollo.camilo@gmail.com.

S i n o p s e
O androide é uma criação do Dr Zéfiro, alto funcionário do DIH (Departamento de inteligência humana) Por falta de verbas no departamento, este cientista pega o seu ajudante da faxina, dando-lhe moradia e um adicional para ajudar no seu projeto secreto। Dr। Zéfiro conduzia vários projetos de inteligência artificial, robôs da série T, e ao completar a criação do T10, sua melhor versão desde o T1, faleceu। O androide ficou aos cuidados do seu Silas, o ajudante e cuidador, sem conhecimentos técnicos, agindo pelo instinto e pela sorte। O que Silas não sabia é que ele e o androide tinham tantas coisas em comum।

sábado, 10 de dezembro de 2011

Eu, papai-noel !



Eu, papai-noel! ! - Você acredita em mim?
Eu já furei minha pantufa, ando de chinelas virando esquina e tropeço no corredor. Tenho dois cachorros brincalhões e um cavalo imaginário. Levanto da cama com lençol na cabeça, mas ainda não sou fantasma. Sou talvez como muitas coisas que não se vê à primeira vista e que não têm função imediata como um cadarço solto, mas arrumei um empreguinho, um bico por enquanto. SOU PAPAI-NOEL AGORA!
Foi um contrato com uma empresa estrangeira, vou vestir-me como um verdadeiro papai-noel. Já tiraram minhas medidas, a barriga está boa, vão acer
tar os cabelos em caracóis, a face é adequada, o meu nariz será tirado e colocado um narigão menos contundente. Nos meus olhos vão pôr lentes azuis bem fininhas para perecer nórdico. O saco, ufa, a melhor parte, vão me dar sacos especiais e vermelhos amarrados com cordões de ouro. A swat vai me treinar a entrada pela chaminé ou casa com cachorros bravos, tempo cronometrado, manobras evasivas para não parecer ladrão, posso ser confundido – ao invés de dar presentes, vão pensar que estou me presenteando. Nada de prazer no trabalho, tenho de ser profissional. Um linguista já me foi tirando aqueles vícios que tenho de uai, ara, tô fora, etc.; ao se abordar uma pessoa tem de falar ôôÔ e só, nada de inventar em cena. Repeti ao diretor uns mil ôôÔ e dormi repetindo para não esquecer, isso até o natal; o resto é figurino.
Estava feliz em ser papai-noel, ia realizar um sonho de acreditar em mim ao menos, já não acreditava neles, papai-noel não existe – sempre achei. Dormi sonhando em ser aquele que sem acreditar, mas via nas minhas fantasias. Na véspera do natal meu ôôÔ estava bom, forte, grave e repetido, fazia o som na hora do café, em todo lugar e os cachorros já vinham me lamber, será que estava os convencendo de ser o bom velhinho?
O natal chegara. Desci em silêncio ao porão onde escondia meu figurino e o espelho de minha esposa. Ouvia os brindes pelas casas vizinhas e vivas de lá e de cá, enquanto eu me arrumava e aquelas pessoas iam adormecer para eu sair com meu trenó escondido na horta. A noite foi avançando no rutilar das estrelas e a hora chegou, peguei o trenó em silêncio e sai amassando uns pés de couve, as janelas fechadas dos quartos vibravam no ressonar de crianças. Esgueirei-me por meio de fios elétricos e galhos e fui descendo em ponto-morto, ah, esse trenó meu era motorizado (esqueci de dizer lá atrás).
Depois de passar todo meu setor e crianças cadastradas voltei e encontrei meus cachorros fazendo festa e meu ôôÔ deu lugar a uma gélida tosse, pronto, eu sabia, logo vi que esquecera alguma coisa. A minha esposa me esperava do outro lado com meu gorro vermelho, inda bem que as crianças não me viram e os adultos não acreditam em mim.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Ossos do ofício

Eu participo de concursos de crônicas e contos por aí, mas ainda não logrei nenhum êxito em ser o premiado. Por certo devo me apurar e, como diz minha esposa, mandar as boas - estas eu deixo para o blog e jornais; todavia, hoje posto uma que foi a perdedora, mas o barnabé também é. Vocês podem encomendar as críticas que acharem devidas, tendo em vista que não conheço as dos jurados e os amigos sempre elogiam para não me perder. Na verdade, fiquei com um pouco de dor de cotovelo e aproveito para parabenizar os ganhadores, inclusive, quem?... minha esposa mesma. Bananas, me passou a perna, rsrsrs. O blog dela é www.literarteluziastoco@blogspot.com e outra ganhadora de Piracicaba é nada menos que Carla Ceres e seu blog é www.carlaceres.blogspot.com - algo além dos livros, com postagens excelentes.

Mas primeiro leiam o meu, tá.




“Bom-dia!” Barnabé estava condicionado pelo programa de vendas que fez. O espelho do corredor respondeu com a imagem de sempre. Testava em si a reação dos clientes. A esposa lá na cozinha o vigiava com o bule de café na mão. Aquele dia ia ser de devorar mais um leão, como diz o povo. O salário da repartição não lhes era suficiente, os filhos que ora dormiam na madrugada, cresciam e demandavam novos gastos e o Estado foi lhe arrochando o nó da gravata até esgoelar um mísero salário e um sorriso falso, pela decepção que não podia expor. Sim, fazia bicos.
Para um vendedor de enciclopédias tinha de ser alegre, entusiasta, não aquele sinistro homem de óculos grossos, de paletó e gravata, que punha termos em papéis públicos. Vendedor de porta em porta, de preferência as que não tinham olho mágico. Às vezes, as portas se abriam e saía o cachorro latindo na frente e o dono ficava só com a cara na porta. Tinha de convencer a ambos que tinha um bom negócio. De longe mesmo exibia o produto, mesmo entre grades, ia folheando as grossas páginas e mostrando as vantagens ao filho do cliente. Não tem filho, é! Mas este produto é um excelente para presentear a um sobrinho, a um amigo e são os últimos exemplares nesse preço.
Dessa vez não deu e, mesmo não vendendo, Barnabé fechou a maleta com um sorriso amarelo escondendo os dentes, tinha de manter portas abertas para negócios futuros. Mas se pedisse um copo d’água, mostrar-se inferior, que precisava vender. Rebaixar-se?! Não, essa era a pior imagem que podia dar a um cliente. Tinha de pensar rápido, porque o homem na porta impacientava, mesmo fingindo bonomia. Deu algumas tossidinhas seca e...quase trocara o nome desse cliente (o nome é importante, principalmente o próprio), mas o homem não ouviu, ou fingira não ouvir? Por fim, de tímido, sobrou a Barnabé um aceno entre os latidos do cachorro. O cliente em potencial bateu a porta e recolheu-se. Via-o pela porta de vidro, dando-lhe as costas. Naquele sol já quente da manhã, não vendera nada ainda e aquele figurão de pijamas (só podia estar) atrás daquela porta de vidro, a transparecer indiferença. Naquela rua já batera em todas as portas, sempre com o mesmo sorriso e bom-dia e quinze portas depois a do homem que lhe fechou a sua e última. Deus fecha uma porta e abre duas, dizia a sua mãe a consolo de contrariedades. A doce mãe que falecera com orgulho de ter um filho no governo, mal sabia que era um contínuo. Se soubesse! No bar, Barnabé até se fazia de bem com seus iguais. Depois da primeira latinha tudo era uma maravilha, fazia questão de passar lá com a roupa de trabalho, as pessoas lhe perguntavam coisas. Quando não sabia, dizia que era sigilo funcional o que aguçava a importância, se insistissem repetia alguns termos, entre goles, que nem ele entendia e o desentendido convencia-se pelo vício – dá mais uma aí.
Ah, o nome do homem, do cliente! Lembrou, podia apertar novamente a campainha. O fez. De dentro veio alguém, contrariado ao vê-lo novamente. “Alberto, o senhor esqueceu o cachorro pra fora!” Enquanto balançava a maleta e o dono o agradecia contrariado, o cachorro não arredava pé dos livros. Casa que tem cachorro sempre vende, os ossinhos para cães os atiça... “Tenho um livro de algumas dicas de como adestrar cães, Alberto”. Vendeu. Ossos do ofício.

(As perdas é que enriquecem minhas crônicas, ahahahahah)