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O blog atém-se às questões humanas. Dispensa extremismos ou patrulhas. Que brilhe a sua luz. Bem-vindo e bem-vinda!

sábado, 28 de julho de 2012

Amigos, grato pelos acessos a este blog e o texto postado hoje, diz das sempre-vivas, mas o faço como alegoria da nossa vida e da transmissão desta, esta passagem que fazemos todos os dias e vemos nos outros e se refletem em nós. Somos os sempre-vivas, naquinhas e tantas sombras que não cabem num consultório de psicanalista. Será que Deus é psicólogo. Não é, sei, mas vez ou outra precisamos deitar no seu divã e espelhar os vitrais da eternidade e eu o faço por meio de literatura. Desculpe-me pelos vidros opacos que lhes tapam a visão, é que sou uma alma desgovernada. Abraço a todos.
Blogueiro de crônicas.
Sempre-vivas
Um barulho na veneziana que dá para a rua, meu quarto está exposto aos pedestres, ao ponto de ônibus. Minha veneziana fica acima de um vaso quadrado de cimento. Flores simples e vagabundas, sempre-vivas.
Este janelão antigo, quase que respira neste quarto, onde já se ouviu os gemidos de dor de meu pai, os soluços de minhas frustrações e os segredos, estes... bem, segredos são.
O sol já adentrava quando abri e vi no chão algumas sempre-vivas de um ladrão apaixonado que correu. Bons são os que correm, não os que matam. Lá vai ele de bengala dobrando a esquina torta. Seu Naquinha, este velhote rouba as sempre-vivas e as derruba no chão. Eu sabia! É sempre assim. Este som onomatopaico de sua bengala que desce pela veneziana, traratrátrá, acorda todo mundo. Além do auxílio na caminhada a bengala lhe é de uso lúdico, como um complemento para apontar, remexer o lixo e bagulhos. Nem caminha tanto com ela, serve mais para conversar, mas desta vez não me viu. Se me visse, furtar-me-ia horas contando coisas que não me interessam, feito eu seu repositório do passado. Ah, meu Deus.
Quero mais é pular esta janela de meus dias e ir para essa calçada ensolarada de mil sóis.
Dói-me o banzo, a dor que me dói como um chicote em retorno do que não fiz, do que não sei e do que vou fazer não sei quando, se tempo houver, não como seu Naquinho que deixa simplesmente passar o tempo.
Mas voltando ao quarto... Por que geme, papai? Nesta cama, por que chora? Dou-lhe meus cavalinhos de madeira e toda minha coleção de soldadinhos. Vou ficar como o Naquinha mesmo, banzo por aí? Não vou mais pilotar teco-teco e correr perigo no ar, mas lá fora o Naquinho com esse tratratá me incomoda o sono.
Ah! Desta vez o velho esqueceu a bengala. Ia esconder, mas acho que vou entregar, e a moça me atendeu na sala de um vaso cheio de sempre-vivas. Até lá tinha essas flores e fui logo perguntando do velhote para devolver a bengala.
- O Naquinha? O Naquinha morreu.
O Naquinha sou eu. Acordei.

2 comentários:

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