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O blog atém-se às questões humanas. Dispensa extremismos ou patrulhas. Que brilhe a sua luz. Bem-vindo e bem-vinda!

sábado, 19 de outubro de 2013

Caros amigos(as) ontem estivemos em Indaiatuba-SP, onde foram escolhidos os trabalhos literários para o mapa cultural do estado de São Paulo. De Piracicaba, Luzia Stocco ganhou aplausos e honras da bancada pelo trabalho Torradas não se despedaçam, mas não conseguimos classificação melhor. Foram interessantes as orientações dos jurados ao público de escritores sobre os trabalhos feitos e seus eventuais problemas, mas também lamentaram que muitos poderiam ter alcançado o primeiro lugar. Dos lidos ao microfone, muitas coisas boas e bem escritas. Penso quando algum texto meu vai ter a honra dos lábios e bocas, além da minha. Snif, snif...(interrupção para chorar, ahahahaha). A minha crônica desclassificada foi Morte Certa, mas eu já sabia assim como a morte é certa, meu texto não estava dos melhores, admito; mas este abaixo está tinindo e saiu do forno há poucos dias no jornal da região.
Juventude transviada
Qual é a imagem do avô de hoje? Perguntei aos jovens. Perguntei sim, pois tenho saudades dos meus avós, até da sisudez deles, meu avô de terno preto, surrado e bem caído, não tinha outro mesmo.
Por piegas ou saudosista que lhes posso parecer, as coisas dantes não eram tão efêmeras, tão portáteis e os presentes de casamento, como uma baixela, passava de mãe para filha e, às vezes, à neta.
As coisas valiam e, por consequência, as palavras também. Não precisava de muita folha para dizer o que se pensava, nem carimbo de ninguém.
O carro do vovô de antigamente, quando o tinha, era cuidado, bem cuidado, e o motor limpo e macio. Ao entrar sentia-se o cheiro de automóvel e do esmero. Qual é o cheiro de automóvel? Ninguém sabe. Antes tudo tinha cheiro, as coisas eram cheiradas, o café cheirava, dava tempo. Coisas boas e ruins tinham cheiro, até gente tinha cheiro de gente, não de perfume.
O mundo era mais simples, sem teclas e atalhos que dão bem mais trabalho e horas em frente da telinha piscante, você não vê, mas ela pisca. Os atalhos eram caminhos no meio da mata ou brejo e de muitos atrativos, encompridavam o tempo. Ah, existia a ideia de lugar, de onde voltar, um sagrado de vivências próprias, que ninguém pode comprar, mesmo que fosse de aluguel ou de favor. Existia o tempo, as estações. As expectativas eram de meses, preparando-se, assuntadas e únicas.
A ideia da casa quase desapareceu, a de minha casa, de almoçar lá, come-se na rua, bebe-se para esquecer e dorme-se ao lado de uma piscina coaxando como sapo. Voltar para casa? Ou para si mesmo? Mora-se mais em apartamentos, no corredor tal onde a luz acende e apaga, lá nunca tem ninguém, mais se passeia, é uma casa dormitório, come-se em alguma esquina, quando volta, viaja, põe a família no facebook e vai embora.
Todavia, hoje acho engodo à forma de pensar nesta figura mítica do velho. A forma ingênua do vovô, da vovó, como se fossem familiares. Essas ideias vêm carreadas pela da bom velhinho e boa vovó, provedores de coisas saborosas, brinquedos e do centro familiar, da mesa ou do chão onde construímos o nosso pequenino mundo, mas crescemos.
O vovô de hoje anda de moto, tem personal trainer, faz implante de cabelo e enxertos, pinta-se para ficar eternamente jovem, a idade não o faz arcar, tem excelente dentição falsa, pratica esportes radicais e, muitas vezes, está acompanhado de sua namorada que tem a idade da neta e ele sabe diferenciar. São, por vezes, problemas à família de tradição e de bons costumes, dando dor de cabeça aos filhos caretas.
Como disse antes, fui perguntar aos jovens sobre os velhos. Um me respondeu assim.
- Que foi, vovô, o que quer?
É, talvez já tenha idade... e eles veem os avós de outra forma que nós. Somos os antepassados deles agora, mas estaremos à altura de suas memórias, de seu tempo?
Creio que há em nós um tempo que não se exaure; pois ainda vejo o tempo preso nos bigodes do meu avô e o meu já vai em decurso, quase a avô.

2 comentários:

  1. Outros tempos!
    Ontem: avó submissa ao avô. Dona de casa. Íntegra! Ele, o provedor. Ela a subalterna.
    Hoje: ambos em igualdade de condição - explorados pelos netos - em viagens, presentes e mimos...
    O digital e o virtual tomaram lugar das historinhas e das bênçãos orantes em família...
    A aceitação de fases da vida tornou-se impraticável... Outros valores! Ai dos avós que não se atualizarem... viram "mico" para os netos!
    Abraço

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  2. Há problemas de valores mesmo, Célia, e seria precisar pensar isso, mas os que pensam são poucos e nada ouvidos, há aí uma pedra enorme no caminho entre as gerações; já que vivemos numa época economicamente melhor e de mais bens de consumo, as coisas e as pessoas perdem seu real valor. Abç

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