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O blog atém-se às questões humanas. Dispensa extremismos ou patrulhas. Que brilhe a sua luz. Bem-vindo e bem-vinda!

domingo, 10 de novembro de 2013

Amigos, amigas do facebook e deste singelo blog, meu irmão quase-gêmeo diz no prefácio de meu livro que sou mesmo em crise. É verdade. Agora mesmo, projetando um novo livro de romances me defronto com vários problemas de enredo e trama e pesquiso, e corrijo até dar ao leitor o melhor entendimento e cadeira dessa leitura. Bem, digo isso porque às vezes exageramos e o perfeito não existe. Alguns vão ler mesmo as primeiras folhas e esquecer o resto ou vão dar a alguém ou ao sebo. Aprendi nessa semana de Fentepira e várias peças teatrais, que mesmo assim, valeu a pena. E por falar em Fentepira, apresentações de teatro em Piracicaba-SP, este texto abaixo foi inspirado numa das cadeiras na apresentação da praça José Bonifácio. Eu pensava no meu pai, como penso muito ainda hoje e verti um texto de ressentimentos que tenho, há muito sentimentos ainda ressentidos, não reparados, não lacrimados, sem escoar, a ecoar dele.
Blogueiro chorão
Autor de Crises do filho do meio
O enterro do palhaço

(ao ler, tirar o nariz vermelho, para melhor respiração)
Ao chegar à coxia Augusto avistou o companheiro exaurido, sentado, com os ombros para frente e os guizos de bobo ainda vibrantes com o tremor do cansaço, de velho. Se não o conhecesse acharia que era o ensejo para mais uma das suas graças de palco e irreverência, mas era um ser voltando-se para dentro, condoído. Não riu Augusto. Somente um palhaço para conhecer outro... Enfermo, padecia de dores nas juntas, nas pernas inchadas sob os sapatos grandões de palhaço e sob as calças largas e coloridas os cambitos tremiam sobre a corda bamba da vida, do seu rosto o azul escorria como um guaxe e o vermelho manchavam-no como um assassino de si mesmo. Quem aceitaria a morte de um espantalho?
Não, Augusto o tomou nos braços e o pôs sobre o tapete das mil e uma noites e... uma palavra, mas qual, seus narizes redondos quase se tocaram na mágica dos olhos que veem crianças, vai fazer graça ao Jesus menino neste natal. Sabia. Vai morrer, não vai lutar como os soldadinhos de chumbo. Morreu.
Os homens da funerária levaram o palhaço ensacado para devolver à família o morto, mais um corpo no velório da sala três, ao lado da cantina e em frente do coqueiro verde. Quem vai? É de graça. Eu não vou, não aguentaria meus próprios soluços. Augusto foi e ninguém o reconheceu sem a fantasia, o andar trôpego, o rebolar e os sapatões disformes. Via-se o amigo no fundo daquela caixa de faraó, embrulhado em flores coloridas e sufocantes na câmara ardente para ser encomendado por um padre ou pastor, diante de quatro velas. Aquele não servia mais. Se pudesse voltar a cena! Não, nem assim chegaria à perfeição; nas mil mortes da vida, essa era capital, perfeita porque única.
Eu posso voltar a cena nesse texto – na verdade, é só o que faço - e lembrar de sua risada histriônica e até craquelante. Ahahahaheeeiii. Que importa o figurino, as pessoas que vieram se compadecer ou por curiosidade, o caixão é sua coxia, nossos sonhos o seu palco e por pouco não descobrimos o que temos diante dos nossos narizes, de palhaços. Num minuto vão focar a luz sobre a sala e as velas vão se apagar com as primeiras brisas da aurora, os pássaros vão catar migalhas e as buzinas se farão presentes outra vez, e o morto, não – decompõe com nossas ideias... sei que as velas vão se apagar em fumaceiras ordinárias com cheiro de ausências, de recordações costumeiras de viver passadiço. Como disse, eu não fui, pois já sou palhaço e não posso me apresentar às estrelas nem impedir o brilho que entra pela minha janela. Adeus, palhaço, seja bem vindo, prepara-te, soldadinho de chumbo!

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